DIÁRIO CATARINENSE - 10 de abril de 2012 | N° 9505
VOZ DA ESQUERDA
O marxismo no mundo moderno
Uma das mais respeitadas vozes da esquerda acadêmica europeia, o sociólogo sueco Göran Therborn (pronuncia-se Giorán Sebóun) está no Brasil para lançar seu livro Do Marxismo ao Pós-marxismo? (Boitempo, R$ 39).
A pergunta que norteia o livro não cansa de ser formulada desde a metade do século passado e adquiriu nova relevância nos anos 2000: o marxismo ainda tem atualidade?
Para ele, a esquerda continuará sempre tendo um papel fundamental na sociedade, já que luta contra a exploração, discriminação e miséria.
Ele destaca ainda a mudança histórica que vem ocorrendo no centro da gravidade do capitalismo, no poder político e cultural mundial.
Entre as análises de Therborn estão, por exemplo, as falhas que conduziram o socialismo soviético ao fracasso.
– A União Soviética foi ao mesmo tempo um farol de luz no mundo e uma casa de horror – declarou. (luiz.araujo@zerohora.com.br - LUIZ ANTÔNIO ARAUJO | PORTO ALEGRE)
a entrevista
“Há mudança no centro de gravidade do capitalismo”
Göran Therborn, Sociólogo sueco
Por e-mail, o sociólogo Göran Therborn, professor aposentado da Universidade de Cambridge, na Grã-Bretanha, respondeu a quatro perguntas da Agência RBS. A seguir, uma síntese das respostas:
Agência RBS – O futuro tem espaço para a esquerda?
Göran Therborn – Obviamente, pelo menos enquanto vivermos na modernidade e sob o capitalismo. A esquerda é um produto do Iluminismo radical e da Revolução Francesa, durante a qual a palavra adquiriu seu significado atual. Sentados à esquerda nas assembleias nacionais da Revolução estavam aqueles representantes que lutaram mais vigorosamente contra os privilégios reais, aristocráticos e capitalistas, contra o antissemitismo e a escravidão, pelos direitos e a liberdade das pessoas comuns. Exploração, humilhação, discriminação, polarização de privilégios e miséria sempre engendrarão resistência e forças de esquerda.
Agência RBS – A crise econômica pós-2008 parece confirmar algumas das teses centrais da teoria marxista. A emergência de fortes economias capitalistas no Brasil, na Índia e na China parece contradizer outras dessas teses. Estamos assistindo a um giro ao Sul na história do capitalismo?
Therborn – Há uma mudança histórica no centro de gravidade no capitalismo, e no poder político e cultural mundial, da área do Atlântico Norte para, em primeiro lugar, o leste e, possivelmente, o sul da Ásia. O Brasil está agora se aproximando da posição de grande poder que reivindicou em vão nos anos 1920. A primeira década deste século tem sido um período raro na história moderna, quando quase todo o Sul – com exceção de poucos países desastrosos – cresceu mais rapidamente que o Norte. Marx não previu isso, mas tampouco disse que seria impossível. Ao contrário, seu argumento geral era o de uma extensiva globalização do capitalismo e, em seu tempo, estava sempre procurando por mudanças nas relações de poder. A suposta impossibilidade de desenvolvimento capitalista na periferia dependente é uma tese pós-marxista. O retorno recorrente de crises econômicas como algo inerente ao capitalismo, por outro lado, encontra guarida em Marx.
Agência RBS – Há alguma passagem das obras de Marx que o senhor pudesse definir como inaceitável do ponto de vista ético e moral atualmente?
Therborn – Marx estava muito fascinado pelo capitalismo global emergente para ter muita compreensão pelos valores existenciais da cultura de povos indígenas e colonizados. O sofrimento deles é algo que o Fórum Social Mundial e o Socialismo do Século 21 Andino colocaram em evidência.
Agência RBS – Quais são os objetivos políticos dos que reclamam o legado de Marx?
Therborn – Organizar e apoiar a resistência à exploração capitalista, à brutalidade humana e às ameaças ao ambiente e lutar por possibilidades de uma vida boa para os 99% da população mundial. Essas são proposições marxistas clássicas, mas alcançá-las hoje requer novas análises e inovações criativas em matéria de organização e mobilização.
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